Por Geisa Agricio do NE10 em 20/01/2012
Foto: Carlos Albuquerque
"Não apenas aquela geração que acompanhou o lançamento de Chico Buarque & Maria Bethânia ao Vivo (1975) é capaz de vislumbrar que dessa parceria surgiu um dos mais fortes e benfazejos encontros da música popular brasileiro. O público que conseguiu garantir o disputado ingresso para o espetáculo do Circuito Banco do Brasil, na noite da última quinta-feira (19), no Teatro Guararapes pode não só devanear no clichê que se tornou regra irrevogável mas constatar com os próprios olhos e ouvidos – e, por que não, coração? – que Bethânia é a na atualidade a personificação da intérprete perfeita da obra de Chico Buarque em sua vasta complexidade.
Superados os comparativos capciosos com as saudosas Elis Regina e Nara Leão, divas incontestes das composições de Chico, Bethânia é, em vida, a voz da poesia de Chico Buarque em seu tom mais bruto, puro e imo. A noite, ainda mais mítica, pela curiosidade de ser a data em que coincidiu o aniversário de 30 anos de morte de Elis Regina e os 70 anos de nascimento de Nara Leão, era na poderosa voz de Maria Bethânia uma confluência das “mulheres de chico”, não apenas suas cantoras, mas todas elas, Rita, Terezinha, e toda alma feminina comum escancarada nas crônicas cotidianas de Chico.
Bethânia sem dúvida fez jus a todas elas, entoando com aquele sotaque em tempo certo de carga dramática assertiva (nem mais nem menos) clássicos como Cala a Boca Bárbara, Tira as Mãos de Mim, Gota d'Água, Terezinha, Sem Açúcar, Olhos nos Olhos e Tatuagem, que hipnotizavam a plateia emocionada entre gritos e silêncios embargados com lágrimas.
Mas também estavam lá todos os Chicos, o político de Apesar de Você e Cálice, o romântico de Valsinha e Todo Sentimento, o sambista de Rita, o malandro de Quem te viu, quem te vê, o carnavalesco de A Noite dos Mascarados e Não Existe Pecado ao Sul do Equador. Sua presença é tão forte que o momento simbólico em que aparece no telão na gravação do dueto histórico de Sem Fantasia, é como se estivesse mesmo ali, olhando para Bethânia.
E tal janela do tempo serve também para a metáfora da própria mudança, da transformação, do caminhar natural. Bethânia está mais velha, mais segura, mais comedida, talvez. Os arranjos são rebuscados e harmônicos, a cenografia refinada, a produção executiva (bem no termo). Mas no corpo, na voz, na palavra, ela transpõe o tempo que passou e põe pra fora a eterna menina de Chico."
Nenhum comentário:
Postar um comentário